EXTRA GLOBO
Entre João, Elis, Joelma e Fiuk está Serguei. Os quatro cachorros, com os nomes de artistas da música popular e do pop brasileiros, são os únicos companheiros da figura do rock psicodélico das décadas de 60 e 70 no Templo do Rock, em Itaúna, onde mora e recebe visitantes e turistas gratuitamente.
Há seis meses ele se afundou numa crise financeira, após um rombo nas contas deixado por um ex-funcionário, segundo conta:
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— Era uma pessoa que cuidava de mim. Fiquei nervoso, não comia bem. Aí vieram os jornais aqui, a televisão.... — desabafa, com a fala embargada e andando com dificuldade. — Eu fui ajudado pelo Gugu [Liberato]. Ele pagou as minhas dívidas e consertou as infiltrações da casa. Depois disso, as coisas melhoraram. Sou muito agradecido a ele por tudo. Mas ainda estou muito cansado, muito nervoso, no geral. As pessoas estão difíceis.
Na conversa, os únicos instantes em que demonstra calmaria e abre sorrisos são os que o artista relembra o namoro com Janis Joplin — “O que eu mais sinto falta são as gargalhadas” — e os anos em que morou nos Estados Unidos. Mesmo isolado, entre as quinquilharias de discos, revistas, jornais antigos e a bota de Joplin, ele continua clipando suas matérias de rock e se informa sobre a política:
— Eu não tenho orgulho de morar no Brasil. Para eu me orgulhar, aqui tinha que ser uma nação. E não é. Olha o que eles [os políticos] estão fazendo com a gente. Não existe mais povo, não existe mais nada. O Brasil não vai a lugar nenhum. Bom era quando eu vivia na Califórnia. O problema é que eles [os americanos] olham para a gente com olhos de cérebro. Olha como eles miram a Amazônia! — brada.
Morador da cidade da Região dos Lagos desde os anos 80 após deixar a capital, o artista diz que ganhou a casa de dois andares e quintal amplo de presente de um amigo surfista.
— Quando ele chegou aqui, a gente achou que fosse mais um maluco, mais um hippie na cidade. Com o tempo é que fomos conhecer a história de verdade — recorda Luiz Nena, esportista veterano no local.
O Templo do Rock, atualmente, recebe ajuda de custo da Prefeitura de Saquarema. O governo reconhece o artista como figura ilustre da cidade e tem seu aniversário na agenda pública do município.
— No dia do meu aniversário, eles me convidam para tomar um café com a prefeita [Franciane Motta] (...) “It pay it all”(Isso recompensa tudo, em tradução direta do inglês). Outro dia, fui ali fora num encontro de motos e as pessoas me cercaram. Fico feliz de ainda levar alegria para as pessoas — emociona-se o cantor.
Esse ano, o eterno beatnik será tema de três filmes em produção: “Ficcicodelia”, “O último beatnik”e “Serguei: 100 anos de sacanagem” (com título sujeito a mudanças), produzido por André Kaveira, seu amigo e produtor. Um dos documentários deverá ser lançado no Festival do Rio.
Apesar do orgulho das novidades, a música em geral não empolga o folclórico cantor. Ao ser perguntado sobre o que ouve atualmente, ele desvia o assunto:
— Eu olho a casa!
Após conhecer Jimi Hendrix e Jim Morrison, a nostalgia se mantém nas falas:
— Eu vi os Rolling Stones e os Beatles, que foram as maiores referências musicais e literárias que o mundo já teve. Com certeza eu tenho saudade da minha geração. Ela foi um marco. Agora, não há comparação. O rock era guitarra, baixo e batera. Nada mais que isso. Era uma resposta que dizia: isso é rock’n roll. Tenho uma vida de 50 anos na música, sou um artista. Cantor é uma coisa, artista é outra. O artista é a alma, o sangue, é o corpo humano. Eu ainda alimento essa máquina.