ROBERTO BOAVENTURA DA SILVA SÁ
Por que dedico estas reflexões a esses colegas? Porque – até onde sei – não condenaram o discurso de Dilma Rousseff sobre o resultado do Produto Interno Bruto (PIB), referente ao mês de maio. Na hora de campanhas eleitorais, esses colegas, alopradamente, desfraldam tais bandeiras; quando, por honestidade acadêmica e cidadania real, deveriam se posicionar, permanecem no silêncio.
Segundo o Banco Central, houve naquele período um encolhimento de 0,02% de nosso PIB, que é a soma das riquezas produzidas pelo país naquele mês. Além disso, sabe-se também que, nos últimos doze meses, nossa economia cresceu apenas 1,27%, abaixo das projeções oficiais.
Diante da realidade, Dilma, durante a Conferência Nacional dos Direitos da Criança/Adolescente, realizada na semana passada, disse, sem pudor, que “Uma grande nação deve ser medida por aquilo que faz com as suas crianças e adolescentes. Não é o PIB, é a capacidade do país, do governo e da sociedade de proteger o que é o seu presente e o seu futuro, que são suas crianças e adolescentes".
Trocando em miúdos, Rousseff aposta que o tamanho de uma nação não se mede com as riquezas produzidas pelo PIB, mas por aquilo que se faz às suas crianças e aos seus adolescentes, como se para fazer algo concreto pudéssemos dispensar recursos. Francamente!
Antes de tudo, fico imaginando se o momento do anúncio do PIB viesse quando a Presidente estivesse num outro tipo de conferência, cujo público fosse constituído, p. ex., por idosos, ou gays, ou negros, ou portadores de algum tipo de deficiência, se ela faria o mesmo discurso pró-criança/adolescente. Será que não adequaria suas palavras para confortar esse outro público? Será que se lembraria de mencionar as crianças e os adolescentes? Oh, dúvida cruel!
Seja como for, afirmo que o governo Dilma – na mesma linhagem de seus antecessores mais diretos, Lula e FHC – já faz muito (mal, é claro) pelas crianças e adolescentes; às vezes, faz de forma direta, mas na maioria, indireta. Como exemplo, cito apenas duas das políticas públicas, ambas já desmontadas: a saúde e a educação formal.
Toda vez que uma criança é levada a um Pronto Socorro/SUS, país afora, ela já é vítima de uma política pública, absolutamente desastrosa por conta da falta de investimentos. Logo, com um PIB menor, menores serão os investimentos. Elementar. Assim, pergunto: a carinhosa presidente, para substituir investimentos, distribuiria só afagos à população?
No campo da educação, é preciso lembrar à carinhosa Dilma que se seu governo quiser fazer algo positivo – além dos afagos – para crianças, adolescentes e jovens, é preciso destinar – sem dó – mais investimentos ao setor. É preciso valorizar de fato o magistério e quem nele atua com melhores salários, menores cargas de trabalho, carreiras salariais adequadas, mais e melhores condições de infraestrutura. Isso sem falar numa revisão do entretenimento/cultura destinado às novas gerações.
Sendo assim, a presidente, se de fato estiver pensando no porvir deste desprovido povo, já poderia pôr em prática seu discurso. Poderia apresentar proposta decente aos docentes das federais em greve desde o dia 17 de maio. No futuro, crianças, adolescentes, jovens e adultos de hoje agradeceriam muitíssimo.
ROBERTO BOAVENTURA DA SILVA SÁ é doutor em Jornalismo pela USP e professor de Literatura na UFMT.
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