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Cuiabá, 19 de Maio de 2024
19 de Maio de 2024

24 de Fevereiro de 2019, 07h:00 - A | A

GERAL / POBREZA IMPORTADA

Venezuelanos pedem esmola e trabalho nas esquinas de Cuiabá; Veja fotos

Muitos precisam mandar dinheiro para os parentes no país de origem. Sem carteira de trabalho e sem opções, eles acabam indo para as ruas. Cerca de 500 venezuelanos foram atendidos pela Pastoral do Migrante de Cuiabá ao longo de 2018

MARCIO CAMILO
DA REDAÇÃO



Venezuelanos espalhados por Cuiabá pedem emprego ou algum tipo de ajuda  nos semáforos e rotatórias das principais avenidas da cidade. Sem carteira de trabalho muitos vão parar na informalidade e conseguem fazer apenas pequenos “bicos” ou diárias de limpeza. Com poucas opções, e precisando mandar dinheiro para os parentes que ficaram no país em crise, eles resolvem encarar os perigos da rua por alguns trocados. Segundo a Pastoral do Migrante de Cuiabá, cerca de 500 venezuelanos já passaram pela casa de apoio ao longo de 2018 até fevereiro deste ano.

Eles estão em rotatórias da Avenida Miguel Sutil, pela extensão da Avenida Historiador Rubens de Mendonça (Avenida do CPA) e na altura do Morro da Luz, na Avenida Tenente Coronel Duarte (Prainha). Muitos desses imigrantes foram trazidos a Cuiabá por aviões da FAB, enviados pelo governo Dilma / Temer. 

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Na Avenida Lava Pés, nas proximidades do Shopping Goiabeiras, está, por exemplo, Belkxs Zambrano, de 55 anos. Ela tinha uma vida estável na Venezuela e morava em um bairro de classe média, sendo proprietária de uma lotérica. Tinha carro, casa e todas condições para oferecer um bom conforto aos quatros filhos.  Mas com o agravamento da crise social, política e econômica no país, nos últimos cinco anos, com a ditadura de Nicolaz Maduro, teve que fechar a empresa e se viu obrigada a vender tudo para tentar a sorte longe da terra natal.

RepórterMT/Arquivo Pessoal

venezuela

Atualmente Belkxs Zambrano mora em uma casa alugada no Bairro Santa Helena em Cuiabá, na companhia de mais sete imigrantes.

No pedaço de papelão que ela mostra para os motoristas está escrito: “Sou venezolana. Preciso de ajuda ou trabalho”.

Ela chega na Avenida Lava Pés por volta das 10h e fica até às 14h e tem que enfrentar os olhares de indiferença de muitos motoristas, mas com muito custo, depois de levantar o papelão por várias vezes, ela vai conseguindo alguns trocados.

Belkxs usa uma roupa surrada e uma pochete amarrada à cintura para guardar as poucas moedas que consegue ao longo da manhã e início da tarde. Seu semblante é de cansaço e tristeza. Mas ela abre um sorriso quando lembra de uma

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Venezuelano pede trabalho com cartaz - foto: RpMT

Venezuela próspera e mais justa socialmente e elogia o antigo ditador. “O Hugo Chaves foi um grande presidente, mas os tempos são outros”, lamenta.

Nesses dias difíceis, a mulher diz que é preciso vencer o orgulho e a vaidade, pois é necessário ajudar a pagar o aluguel de R$ 1600 de uma casa que foi alugada no Bairro Santa Helena, próximo à rodoviária de Cuiabá. Além dela, moram mais sete imigrantes no local, sendo ao todo cinco venezuelanos e três cubanos, que também saem pelas ruas pedindo um emprego ou esmola. Alguns ainda conseguem fazer pequenos serviços gerais, e o dinheiro arrecadado paga o aluguel e a comida.

Seu filho, Luiz Alejandro, de 21 anos, um rapaz simpático, de conversa fácil, está na mesma situação. Ele é mecânico e, durante um mês espalhou currículos pela cidade, mas ainda não conseguiu nada. 

Conta que, junto com a mãe e mais de três primos, saíram de Boa Vista (RR), principal destino de chegada dos Venezuelanos no Brasil, seguiram para Manaus (AM), depois para Porto Velho (RO) e compraram passagens de ônibus para Cuiabá. A saga, até agora, não resultou em grandes frutos, mas a situação, segundo Alejandro, ainda está melhor do que na Venezuela. “Lá a inflação está tão alta que o salário mínimo dá apenas para comprar uma refeição no dia”, disse o jovem falando em portunhol.

Empatia

Já fazia duas horas que Belkxs estava no sinaleiro quando um casal se aproximou e começou a conversar com a mulher. Tratava-se de Pablo Hernandez, 20 anos; e Vanessa Campos, 28 anos, que também são venezuelanos. Elas se sensibilizaram com os compatriotas e acabaram por oferecer uma diária de faxina na casa deles para Belkxs: “Sou venezuelana e sei muito bem a dificuldade que nós temos para arranjar emprego por aqui”, destaca Vanessa.

Vanessa e o esposo tiveram mais sorte do que Belkxs e os filhos. Logo que chegaram em Cuiabá, há dois meses, conseguiram emprego numa empresa de tapeçaria personali'zada. Lá eles trabalham no setor de publicidade. Vanessa coordena a equipe de criação dos modelos dos tapetes e Hernandez é designer gráfico.

Vanessa conta que, na Venezuela, tinha uma empresa nesse ramo e que, devido à crise, teve que fechar o negócio. Como tinha alguns contatos em Cuiabá, resolveu vir para a cidade e, assim que chegou, conseguiu emprego.

Na Venezuela, Vanessa ressalta que as coisas estão “dramáticas”. O povo está sem esperança, a economia não melhora, muita gente está desiludida com o governo e a taxa de suicídio não para de crescer.

Lembrou o caso chocante de uma adolescente de 13 anos, que estava grávida e que procurou um hospital, após sentir forte dores. O médico disse que ela precisava de medicamentos, além de passar por uma cirurgia, mas que não havia os insumos nescessários para o procedimento. “Sem dinheiro para comprar os remédios, a menina entrou em desespero, subiu até o terraço do hospital e se jogou”, disse Vanessa.

Jovem casal da Venezuela

Luis Calzadilla, 23 anos, já está há pelo menos uma hora em um dos movimentados cruzamentos da Avenida do CPA, que fica próximo a Igreja dos Mórmons. O sol de trinta e cinco graus castiga o rosto do rapaz que tenta se proteger com um cobertor velho. Ele pede ajuda na companhia da esposa, Annerys Martinez, de 20 anos, e da filha com apenas um mês e 20 dias de vida. Para se proteger do sol, a mãe fica com a bebê debaixo de uma sombra formada por um pequeno arbusto no canteiro central da avenida.

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 Luis Calzadilla pede ajuda em semáfora da Avenida do CPA na companhia da esposa e da filha com apenas um mês de vida

“Ninguém quer ficar com um pedaço de papelão nesse sol quente pedindo ajuda. Você não gostaria de sair daqui para ir à Venezuela pra ficar fazendo isso. Mas é uma questão de necessidade. Preciso comprar comida para minha mulher e filha e pagar o aluguel”, ressalta Luis que deixou a Venezuela há cinco meses.

Como a grande maioria dos venezuelanos, ele entrou no Brasil pela fronteira de Boa Vista (RO) e depois viajou de balsa entre Manaus (AM) a Porto Velho (RO). Como estava difícil de arranjar emprego por lá, há 18 dias resolveu vir para Cuiabá.

Atualmente Luis aluga uma casa no Bairro Carumbé, com o dinheiro que conseguiu da venda do seu carro. Mas a grana, segundo ele, só dá para pagar mais um mês e a necessidade de um emprego fixo é mais urgente do nunca.

Nesta semana, ele irá participar de uma entrevista de emprego. Diferente de Alejandro, o filho da Belkxs, ele conseguiu tirar a carteira de trabalho, o que pode facilitar a sua contratação. “Preciso desse emprego, pois minha mãe e irmãos ficaram na Venezuela e estou tentando mandar dinheiro para eles também”.

Na Venezuela o problema não é a falta de emprego, mas sim os salários que as empresas oferecem, que é praticamente engolido por uma inflação, que ao longo de 2018 chegou aos incríveis 1,3 milhões por cento, segundo os dados da Assembleia Nacional Venezuelana.

“Eu trabalho como pintor. Pinto casas e prédios comerciais. Na Venezuela eu tinha emprego, mas o salário só dava para comprar um frango e um saco de arroz por mês”.

Apesar de toda crise econômica, social e política, Luis e a esposa querem voltar para o país de origem o quanto antes. “É a minha pátria. É um país maravilhoso, mas no momento as coisas estão muito difíceis por lá. Não há comida, saúde e muito menos educação para o povo”, lamentou.

RepórterMT

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 Venezuelano pede ajuda em cruzemento próximo a Avenida Tenenente Coronel Duarte (Prainha) no Centro Histórico de Cuiabá.

Pastoral do Migrante

Segundo a Pastoral do Migrante, que é ligada a igreja Católica, a maioria dos cerca de 500 Venezuelanos que já passaram pela casa até o momento vieram da cidade de Pacaraima, no Estado de Roraima, mas muitos já chegaram à capital mato-grossense por Cáceres, passando pela fronteira da Bolívia.

A coordenadora da organização, Eliana Vitaliano, explica que muitos venezuelanos deixaram filhos pequenos e pais doentes e precisam mandar dinheiro para eles. Diante da necessidade, sem conseguir um emprego formal, eles acabam indo parar no sinaleiro.

Segundo ela, o problema é agravado devido à falta da carteira de trabalho, que impede a contratação formal dos venezuelanos. Destaca que muitos chegam a Cuiabá sem a documentação da imigração que é elaborada pela Polícia Federal, logo na fronteira entre o Brasil e a Venezuela.

Na Superintendência da Polícia Federal em Mato Grosso o agendamento de venezuelanos para regularizar a documentação vai até maio. Com a documentação regularizada a média para tirar a carteira é de 45 dias. Sem o aval da PF, o procedimento pode levar mais de dois meses.

Segundo Eliana, a Pastoral orienta os Venezuelanos a não ficarem nos semáforos, principalmente com crianças, devido aos riscos de acidente e por expor o menor em uma situação vexatória. “Mas por outro lado a gente entende a necessidade deles. Então o nosso pedido é mais para que eles não levem as crianças quando forem pedir ajuda”. 

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